Muitos dos games mais jogados no mundo dão aos usuários a possibilidade de realizar alterações do avatar que servirá para seguir com o jogo. Nestes casos, fica a critério dos usuários escolher, por exemplo, o formato do rosto, dos olhos, a cor dos olhos, dos cabelos, de penteados, acessórios, e assim por diante. Seja uma customização nas características físicas ou meramente nas vestimentas, os avatares variam de acordo com as escolhas de seus jogadores, podendo um mesmo jogo de videogame ter tantas variantes nas características dos avatares que todas as combinações possíveis chegam a ser milhares.
De certo que toda escolha fica a critério do usuário, e por isso seu avatar pode assumir imagem extremamente semelhante a si mesmo, ou então ter forma extremamente diversa de si, se assim o jogador desejar. Em paralelo, dia após dia, com o desenvolvimento e expansão do metaverso, é cada vez mais comum que passamos a imaginar versões virtuais de nós mesmos dentro de uma realidade virtual.
Diante disto, de certo que a nossa própria imagem está sendo cada vez mais exposta em ambientes virtuais. A partir de então, passa a ser legítima a preocupação da defesa ao nosso direito de imagem em jogos e outros ambientes virtuais, tal como ocorre no metaverso.
Juntamente aos direitos a honra, intimidade e vida privada, o direito de imagem é assegurado com os referidos direitos da personalidade pelo inciso X do artigo 5º da Constituição Federal. O texto constitucional deu base para que normas infraconstitucionais também ofereçam proteção a este direito, como ocorre nos artigos 11 a 21 do Código Civil vigente.
Os textos legais entendem como imagem não somente aquilo que se extrai ao ver, no sentido literal da palavra, um indivíduo, mas também defendem a imagem que alguém possa ter para com a sociedade. Caso a imagem de alguém seja violada, isto é, usada por terceiros sem a devida autorização, ou caso ela reste ofendida, é cabível indenização ao ofendido independentemente de comprovação de efetivo dano, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Após a breve digressão de termos jurídicos, é necessário entender que as discussões acerca da garantia de imagem em ambientes virtuais, tais como o metaverso, ainda são muito incipientes. Em que pese este fato, já se entende que mesmo fora do mundo real os direitos da personalidade merecem ser assegurados. Apenas a título de exemplo, recentemente uma usuária afirma ter sido violentada sexualmente enquanto estava no metaverso, fazendo com que a plataforma se encarregue de apurar o crime ocorrido “em suas dependências” se é que podemos dizer assim, diante das violações ocorridas contra ela e seu corpo, ainda que na forma de avatar¹.
Resta claro, portanto, que naqueles casos em que os avatares dos usuários forem similares a sua aparência real, seu direito de imagem merece ser resguardado eis que representam de fato a sua imagem, devendo cada uso por parte de outro usuário, ou do próprio jogo ou plataforma, ser previamente solicitado ao detentor deste direito, sendo a violação passível de indenização.
No entanto, faz-se necessário ter cautela antes de eventual litígio devido ao uso por terceiros, eis que muitas das plataformas e jogos já podem ter inserido cláusulas de cessão de imagem em seus termos de uso. Nestes casos, não há como o usuário se insurgir diante do uso de sua imagem pelos jogos e plataformas, eis que ele anuiu com tal cessão de direito para ter acesso ao conteúdo que lhe foi oferecido.
Cabe ao usuário de jogos e plataformas de metaverso assegurar que não está concedendo facilmente um direito tão caro e pessoal quanto o direito de imagem a grandes companhias de tecnologia caso ele não deseje que sua imagem seja potencialmente utilizada e difundida por diversos meios de comunicação. Os direitos da personalidade que tanto nos são caros devem ser assegurados tanto no âmbito real quanto no virtual. Uma vez que seus direitos foram cedidos através de termos de uso ou de consentimento, nada pode ser feito, sob a perspectiva legal. Tal fato acaba se tornando uma escolha desafiadora aos usuários, vez que caso ele não esteja apto a abdicar de direitos como este, terá que abrir mão de momentos de recreação e lazer.
[1] Mulher diz ter sofrido estupro coletivo no Metaverso. IG TECNOLOGIA. 03/02/2022. Disponível em: <https://tecnologia.ig.com.br/2022-02-03/mulher-estupro-coletivo-metaverso.html.amp>. Acessado em: 27/05/2022
Por Gustavo Campanili, advogado do CQS/FV Advogados