Por Daniella Galvão e Armando Scarpelli*
Uma série de atos normativos integrantes do chamado pacote de medidas de recuperação fiscal foi publicada no Diário Oficial da União, em 12 de janeiro deste ano.
Esse conjunto de normas foi anunciado pela equipe econômica do Governo Federal como uma forma de reduzir o rombo nas contas públicas.
Neste artigo, destacamos as três principais medidas trazidas pelo pacote:
1 – Medida Provisória nº 1.160/2023: institui a volta do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).
Historicamente, os julgamentos do CARF, que resultam em empate quanto à posição dos conselheiros, são resolvidos pelo voto de qualidade do presidente do órgão colegiado julgador.
Pela legislação, a presidência dos órgãos julgadores é ocupada sempre por conselheiro representante da Fazenda Nacional. Sendo assim, é muito comum que esse julgador tenha posição alinhada com as pretensões arrecadatórias das autoridades fiscais.
Em 2020, a Lei nº 13.988/2020 alterou essa sistemática, dispondo que, em caso de empate no julgamento, o litígio administrativo resolve-se em favor do contribuinte.
Essa metodologia de julgamento, que eliminara o voto de qualidade, ocasionou sensíveis alterações na jurisprudência do CARF. Teses em que o contribuinte normalmente seria vencido, prevalecendo a posição do Fisco, passaram a ser resolvidas em seu favor durante a época em que não mais existia o voto de qualidade.
Com o advento dessa nova medida provisória, o sistema de julgamento volta a se dar pelo voto de qualidade, tal como era antes de 2020, ao que é de se esperar que o CARF passe a revisar sua jurisprudência, desta vez, em desfavor do contribuinte.
2 – Medida Provisória nº 1.159/2023: proíbe que a apuração dos créditos pelo contribuinte sujeito à sistemática não cumulativa da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) considere o valor do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) incidente na operação anterior.
Essa medida provisória altera a legislação da contribuição ao PIS e da COFINS, acatando a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema e esclarecendo que o ICMS não integra a base de cálculo do PIS/COFINS.
Entretanto, a medida provisória também veda que os contribuintes, ao apurarem créditos de PIS/COFINS, considerem o valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição.
Assim, os contribuintes irão, a partir de agora, ter uma significativa redução nos valores dos créditos de PIS/COFINS, o que aumentará o valor a ser pago à União em relação a essas contribuições.
3 – Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1/2023: institui o Programa de Redução de Litigiosidade Fiscal (PRLF), anunciado pela equipe econômica do Governo como Programa Litígio Zero.
Esse programa objetiva a redução de litígios administrativos tributários entre contribuintes e União.
Ele envolve parcelamento de créditos tributários, permissão de utilização de prejuízo fiscal relativo ao Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas (IRPJ) e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), bem como permissão de utilização de créditos decorrentes de precatórios judiciais devidos pela União, suas autarquias e fundações públicas, mesmo os adquiridos de terceiros.
A adesão deve ser feita entre 1º de fevereiro e 31 de março de 2023.
Basicamente, existem duas modalidades de transação no programa:
3.1 – Créditos com recursos pendentes na Delegacias de Julgamento (DRJ) ou no CARF:
Esses créditos, a depender da capacidade de pagamento do contribuinte e da sua classificação de recuperabilidade, podem ser parcelados em até nove prestações mensais. Pode haver redução de multa e juros em até 100%, limitada a 50% ou 65% do valor dos créditos, a depender das características da transação.
Deve haver pagamento de entrada para essa modalidade de transação, a qual também pode ser parcelada, nos limites da portaria.
3.2 – Créditos considerados como integrantes de contencioso de pequeno valor (até 60 salários mínimos):
Créditos tributários com valor de até 60 salários mínimos e cujo sujeito passivo seja pessoa natural, microempresa ou empresa de pequeno porte podem ser negociados no âmbito do programa.
Deverá haver pagamento de entrada (4% do valor consolidado) em até quatro prestações mensais. O restante pode ser pago com redução de 50%, inclusive do montante principal, em até dois meses ou em até oito meses com redução de 40%, inclusive sobre o montante principal.
Essa modalidade aplica-se também a créditos inscritos em dívida ativa da União há mais de um ano.
Por fim, a portaria não se aplica a créditos apurados na forma do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples Nacional, instituído pela Lei Complementar nº 123/2006.
*Daniella Galvão é sócia do CQS/FV Advogados. Armando Scarpelli é gerente da área tributária do escritório.
Legenda e crédito da imagem do topo: Detalhe de um calculadora de bolso/Charles Deluvio/Unsplash