CULTURA: COMPLIANCE E PATROCÍNIO SEGURO
Via Revista Jurídica Consulex
“É possível às empresas patrocinadoras e patrocinadas aprimorarem sua governança de forma a dar continuidade às suas atividades de forma segura, além de alinharem-se com as melhores práticas de transparência que o cenário atual demanda.”
POR ALINE AKEMI FREITAS e ROBERTO DRAGO PELOSI JUCÁ
Quem faz cultura são as pessoas, mas quem impleementa e traça os rumos do controle, quando financia, é o Estado. Daí, aparecerem algumas contraposições na execução dos projetos financiados com recursos públicos. Em junho último, foi deflagrada pela Polícia Federal a operação ‘Boca Livre` para apurar possíveis irregularidades praticadas por uma produtora específica na execução de projetos aprovados pela Lei Rouanet de incentivo à cultura (Lei nº 8.313/1991). A operação decorreu de ações de controle realizadas pelo Ministério da Cultura com a instauração de tomada de conta especial, para verificação de possível dano ao erário.
É importante que o controle dos mecanismos de fomento seja exercido de maneira exemplar. Apurar irregularidades, propor melhorias e orientar o mercado sobre procedimentos proibidos e permitidos por esses mecanismos são medidas de máxima relevância e não podem ser esporádicas, devendo ser parte da rotina daqueles que acompanham e monitoram as atividades do particular e do Poder Público.
A atuação da produtora foi isolada e não contamina o mecanismo federal de incentivo à cultura, que tem seus próprios instrumentos eficazes de controle. Contudo, após a operação da Polícia Federal duas perguntas têm ressoado no mercado cultural, tanto para proponentes como para patrocinadores de projetos incentivados:
1 – Quais são os limites para a contrapartida das empresas que financiam projetos culturais a partir do uso da lei Rouanet?
2 – Quais as medidas preventivas para que os patrocínios sejam feitos de forma segura?
Sobre a primeira pergunta, vale lembrar que a legislação prevê ao patrocinador, basicamente, contrapartidas de três naturezas: o benefício fiscal (integral ou parcial, conforme a área em que o projeto foi enquadrado); a inserção de sua marca nas peças de comunicação e nos produtos resultantes do projeto; e até 10% dos ingressos ou produtos-exemplares do projeto. Ainda assim, permanecem questões sobre a forma de distribuição dos 10% dos ingressos ou produtos-exemplares do produto cultural objeto do projeto e dos limites das ativações de marketing criadas para o projeto.
A segunda resposta também é importante e precisa ser bem explicada. Como medida de aperfeiçoamento da governança interna, as empresas e as entidades, patrocinadoras e patrocinadas, têm adotado ações de duas naturezas. A primeira, uma auditoria para reavaliação dos contratos de patrocínio celebrados aliada à adoção de manuais internos de procedimentos para a efetivação de patrocínios seguros. A segunda, a implantação ou o aperfeiçoamento de programas de integridade com base na Lei Anticorrupção.
Em agosto de 2013, foi publicada a Lei n° 12.846, conhecida como Lei Anticorrupção, que trata das responsabilizações administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
De acordo com esta lei, quaisquer sociedades empresárias e simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, estão sujeitas às suas determinações, principalmente as que administrem ou recebam recursos públicos ou que se relacionem com o Poder Público.
A lei estipula como regra a responsabilidade objetiva, ou seja, a pessoa jurídica responde pelas condutas praticadas em seu interesse ou benefício, independentemente da responsabilização individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito, incluindo neste rol os funcionários e os terceiros com quem a empresa se relaciona. Assim, como forma de proteção, a empresa pode implementar um sistema de ações com foco no compliance anticorrupção, estruturadas num programa de integridade.
Com essas medidas preventivas é possível às empresas patrocinadoras e patrocinadas aprimorarem sua governança de forma a dar continuidade às suas atividades de forma segura, além de alinharem-se com as melhores práticas de transparência que o cenário atual demanda.
ALINE AKEMI FREITAS é advogada e sócia do Cesnik, Quintino e Salinas Advogados. Graduada e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, autora de diversos artigos da área, membro da Comissão de Estudos de Mídia e Entretimento do IASP.
ROBERTO DRAGO PELOSI JUCÁ é advogado e sócio do Cesnik, Quintino e Salinas Advogados. Especialista em Direito do Estado pela UERJ e membro da Comissão de Propriedade Intelectual da OAB-DF.